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STJ decidirá se danos morais não precisam ser provados na violência doméstica

Por Regina Beatriz Tavares da Silva*


Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidirá, em breve, se nos casos de violência doméstica contra a mulher é possível a fixação de indenização mínima por dano moral sem a necessidade de prova específica. O julgamento terá como objeto dois recursos especiais, que serão apreciados sob o rito dos repetitivos e, por isso, será determinante para o julgamento de muitas outras ações nas quais estão em questão demandas idênticas. O relator do recurso, Ministro Rogério Schietti Cruz, já proferiu seu voto no sentido de que nos casos de violência contra a mulher praticada no âmbito doméstico e familiar, a indenização por dano moral prevista pelo art. 387, IV, do Código de Processo Penal independe de prova do prejuízo sofrido, havendo necessidade, apenas, de pedido expresso da acusação ou da parte ofendida, ainda que não especificada a quantia. Pode causar alguma estranheza que a condenação judicial de alguém no pagamento de indenização dispense a prova do dano que acarretou à outra pessoa.


Mas, como veremos, o Ministro Rogério Schietti decidiu bem, ao firmar o pensamento de que “em se tratando de lesão corporal praticada com violência à mulher, no âmbito doméstico e familiar, é possível a fixação de valor mínimo indenizatório a título de dano moral, independentemente de instrução específica, desde que haja pedido expresso da acusação ou da parte ofendida”.


O saudoso professor Carlos Alberto Bittar obteve a cátedra na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo com tese sobre a dispensa da prova do dano moral, intitulada “Reparação civil por danos morais” e publicada em 1992.


Primeiramente é preciso entender o que é o dano moral e sua distinção do dano material. Assim ficará fácil compreender porque o dano moral independe de prova e o dano material exige a prova de sua existência para que ocorra a condenação no pagamento da respectiva indenização.


Dano material é o prejuízo econômico ou financeiro que a vítima teve, ou seja, aquilo que perdeu e aquilo que deixou de lucrar em razão do ato ilícito praticado pelo ofensor.


Já o dano moral decorre de ofensa a direitos da personalidade, entre os quais estão a integridade física. Daí decorre sua gravidade, emergindo o dano moral da realidade fática, ou seja, da própria ofensa corporal.


Assim não é difícil perceber a razão pela qual na violência doméstica o dano moral decorre do próprio fato. No caso que está em julgamento pelo STJ, a mulher foi atingida por um tapa de seu companheiro de tamanha força que foi levada ao chão, tendo sido atropelada por ele logo em seguida.


É desnecessária a prova do sofrimento dessa companheira atingida por tamanha agressão. O dano moral é evidente e decorre da própria agressão física, não há qualquer necessidade de comprovação, por parte dela, de que sofreu um dano, ou de que teria ficado emocionalmente abalada.

O dano moral decorre do fato grave da agressão praticada pelo companheiro.


E como quantificar a indenização do dano moral?


Dois são os critérios: a compensação ao sofrimento da pessoa lesada e o desestímulo ao ofensor. Para que se alcance tal compensação e a indenização sirva para alertar o agressor de que não deve praticar outros atos ilícitos, é necessário avaliar as condições econômicas da vítima e do agressor, o grau de sua culpa e a repercussão da ofensa na esfera da personalidade da pessoa ofendida. Assim, muito embora o dano moral em si independa de prova, a quantificação da indenização respectiva, por depender da análise de todos aqueles elementos, necessita de ampla instrução probatória.


No caso apresentado, ao que parece, o grau da culpa do ofensor que estapeia a mulher e ainda a atropela a seguir, por óbvio, é gravíssimo; a repercussão da ofensa na integridade física e moral da companheira também é evidentemente grande. Mas quais seriam as condições econômicas ou financeiras da vítima?

Na esfera penal, onde o processo está em julgamento, a instrução probatória é restrita e muito menos abrangente do que as provas que podem ser realizadas na esfera civil.


Por esse motivo, o Código de Processo Penal, no art. 387, IV, estabelece que o juiz, ao proferir sentença condenatória, fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração.

Assim, segundo o voto já proferido pelo Ministro Rogério Schietti, o valor indenizatório do dano moral será mínimo, tendo em vista não haver a possibilidade de demonstração na esfera penal de todos os elementos que em conjunto devem basear a sua fixação.


Caso a vítima não se sinta compensada com o valor mínimo da indenização estabelecido no processo penal, poderá ser promovida pela vítima ação indenizatória de natureza civil, na qual caberá ampla produção de provas e haverá a possibilidade de avaliar todos aqueles elementos que norteiam a indenização do dano moral.


No entanto, é preciso lembrar que, tanto na esfera penal como na esfera civil, o ato em si da violência deve ficar comprovado, ou seja, a agressão física da qual decorre o dano moral.


*Regina Beatriz Tavares da Silva é Presidente da Associação de Direito de Família e das Sucessões (ADFAS), doutora em direito pela USP e advogada sócia-fundadora de Regina Beatriz Tavares da Silva Sociedade de Advogados.


Publicação original: O Estado de São Paulo – Blog do Fausto Macedo (10/01/2018).

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