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Felicidade em adultério com dinheiro público

Por Regina Beatriz Tavares da Silva*


Em recente manifestação no Recurso Extraordinário n. 883.168/SC, de relatoria do Ministro Luiz Fux, que tramita no Supremo Tribunal Federal, o Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP) defende a ideia e de que a pensão por morte deve ser dividida entre a esposa e a amante, ou seja, diante do adultério.


Além de manifestamente contrária ao direito, à moral e aos costumes da nossa sociedade que não aceitam a mancebia, a posição pela concessão de direitos previdenciários em casos de adultério vai na contramão de todos os esforços que têm sido empreendidos para reduzir os custos da Previdência Social no Brasil.


Isso porque, sobrevindo a morte do cônjuge, o amante seria beneficiário da totalidade da pensão por morte, já que segundo o art. 77, § 1º, da Lei Geral da Previdência (Lei 8.213/91), o benefício é rateado entre todos os pensionistas, revertendo-se em favor dos demais a parte daquele cujo direito à pensão cessar.


Por outras palavras, se viessem a ser atribuídos direitos previdenciários à amante, primeiramente ela os dividiria com a viúva do falecido e, depois da morte da viúva, passaria a receber esses benefícios na totalidade. Isso, obviamente, acarretaria mais um fator para o aumento dos custos da Previdência Social.

Note-se que o Recurso Extraordinário tem repercussão geral. Se forem atribuídos direitos previdenciários no caso, em todos os casos de relação adulterina, os amantes terão o direito de recebimento de pensão por morte do concubino falecido.

Não há como confundir a união estável, também conhecida como concubinato puro, com o adultério, que é o concubinato impuro. O Código Civil, harmonizando-se com aquilo o que determina a Constituição Federal, é claro em estabelecer a diferença. Enquanto a união estável é a relação em que duas pessoas convivem publicamente, de maneira contínua e duradoura, estabelecida em constituição de família “(CC, art. 1.723), o adultério é relação ilícita, em descumprimento do dever conjugal de fidelidade que existe no casamento (CC, art. 1.727).

A união estável é equiparada ao casamento em efeitos jurídicos, enquanto o concubinato impuro ou adultério impede qualquer possibilidade de constituição de família.

É evidente que a mera situação de fato do adultério não pode produzir efeitos de direito de família. Se os amantes têm uma relação afetiva, isto não é suficiente para que essa relação gere efeitos jurídicos, inclusive previdenciários.

Não são todos os fatos que merecem a proteção do ordenamento jurídico. O adultério, como fato, obviamente não tem essa proteção.

A capacidade de amar mais de uma pessoa ao mesmo tempo não comporta análise jurídica, sendo assunto a ser tratado nos divãs de psicanálise. Porém, a inexistência de efeitos previdenciários na relação de adultério pertence à seara da ciência do direito, conforme manifestou-se a ADFAS, que figura como amicus curiae no Recurso Extraordinário de repercussão geral em tela.

No direito brasileiro, a bigamia, além de ser crime, acarreta a invalidade do segundo casamento. É evidente que também não pode produzir efeitos jurídicos a relação de fato simultânea ao casamento.

A lei ressalva a atribuição de efeitos jurídicos à relação de uma pessoa que tenha estado civil de casada com terceira pessoa somente se estiver efetivamente separada de fato do seu cônjuge, desde que preenchidos todos os demais requisitos estabelecidos no Código Civil, devendo o relacionamento ser público, contínuo e duradouro e em constituição de família (Código Civil, art. 1723, § 1º).

E a outra hipótese de atribuição de efeitos jurídicos à relação de quem é casado com terceira pessoa é a chamada união putativa, em que existe a boa-fé da terceira pessoa, que não sabe que está se relacionando com alguém que é casado, em analogia ao disposto no art. 1.561 do Código Civil sobre casamento putativo. No entanto, nos dias atuais, a relação putativa ou de boa-fé é raríssima. Diante do avanço da internet e o surgimento das redes sociais, ocorre a aproximação virtual das pessoas, de modo que as informações estão muito acessíveis, tornando-se excepcionalíssima a ignorância de um fato como a existência de um casamento pré-constituído.

A manifestação do IBDP, data venia, deturpa o significado das Súmulas 380 (“comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum.”) e 382 (“A vida em comum sob o mesmo teto, more uxorio, não é indispensável à caracterização do concubinato”) do Supremo Tribunal Federal, ao afirmar que teriam aberto o caminho para a divisão da pensão por morte com o amante. Na realidade, quando se referem a “concubinato”, essas súmulas fazem menção ao “concubinato puro” e não ao adultério.

Note-se que existe consolidada jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, assim como do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que não devem ser atribuídos efeitos jurídicos ao adultério.

A título de exemplo, vejamos o caso apreciado pelo STF, no Recurso Extraordinário n. 397762, de relatoria do Ministro Marco Aurélio, envolvendo Joana da Paixão Luz e Valdemar do Amor Divino Santos e que foi objeto de recursos em várias instâncias. Este caso envolvia uma mulher, que foi amante de um homem falecido e que deixou viúva. Aquela mulher, de nome Joana Paixão, promoveu ação requerendo a divisão da pensão com a viúva de Waldemar do Divino Amor. É preciso esclarecer que o desfecho do caso no Supremo Tribunal Federal foi no sentido de não atribuição de direitos previdenciários à amante.

A informação sobre um julgamento do Poder Judiciário deve sempre ser dada levando em consideração o desfecho final da ação, em sua última instância. Se uma instância inferior concedeu um benefício previdenciário, o que importa notar é a decisão final no processo. Nas instâncias superiores, os desfechos finais dos processos, com análise de mérito, não concedem direito previdenciário a amantes, como apontei aqui e aqui.

Em suma, é preciso zelar pela Família brasileira e pela sustentabilidade da Previdência Social, sob o prisma do Direito e da Moralidade. *Regina Beatriz Tavares da Silva é Presidente da Associação de Direito de Família e das Sucessões (ADFAS), doutora em direito pela USP e advogada sócia-fundadora de Regina Beatriz Tavares da Silva Sociedade de Advogados.


Publicação original: O Estado de São Paulo Digital – Blog do Fausto Macedo (05/03/2018)


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