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O CNJ proibiu a multiparentalidade em Cartório de Registro Civil

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) já esclareceu que não é permitido o registro de dois pais e duas mães para um mesmo filho em procedimento administrativo.


Mas ainda há quem continue a insistir no “monstrengo” da multiparentalidade por mero ato registral. Esta é a razão deste artigo.


Em 2017, por meio do provimento n.º 63, o CNJ regulou o reconhecimento da paternidade socioafetiva pelos Cartórios de Registro Civil, estabelecendo no art. 10 que: O reconhecimento voluntário da paternidade ou da maternidade socioafetiva de pessoa de qualquer idade será autorizado perante os oficiais de registro civil das pessoas naturais. E no art. 14 que O reconhecimento da paternidade ou maternidade socioafetiva somente poderá ser realizado de forma unilateral e não implicará o registro de mais de dois pais e de duas mães no campo FILIAÇÃO no assento de nascimento.


Passou, então, a existir a interpretação de que poderia um filho, já registrado por uma mãe e um pai biológicos (pai e mãe na acepção do termo), ter em sua certidão de nascimento mais um pai e uma mãe socioafetivos.


Imaginemos a seguinte situação: um casal com filho se separa, cada um casa-se novamente, ou mesmo passa a viver em união estável. Todos se dão muito bem, pai, padrasto, mãe e madrasta. Num dia de muitas comemorações, regado a cerveja ou champanhe, resolvem todos ir ao Cartório e registrar o filho do primeiro casal como tendo mais um pai e mais uma mãe.


Um desastre, inclusive porque essa multiparentalidade, de dois pais e de duas mães seria irrevogável e o filho, tendo menos de 12 anos, nem precisaria autorizar.


Se os novos casais se separassem, todos poderiam disputar a guarda daquela criança e todos seriam obrigados também a pagar-lhe pensão alimentícia.


Ainda, diante de falecimento dos antes padrastos e depois do registro pai e mãe socioafetivos o filho também teria direitos sucessórios e a recíproca seria verdadeira. Imaginem que esse filho morresse e antes tivesse herdado uma fortuna do pai biológico anteriormente falecido, o ex padrasto e a ex madrasta concorreriam com a mãe biológica na sua herança.


Uma verdadeira confusão no Direito de Família e das Sucessões. Tudo contrário à organização das relações familiares e sucessórias que deve ser feita pelo Direito.

A Corregedoria-Geral de Justiça do Estado do Ceará requereu providências ao CNJ, para pedir esclarecimentos sobre a interpretação do referido art. 14 do Provimento 63/2017-CNJ (pedido de providências, n.º 0003325-80.2018.2.00.0000).


O CNJ, em decisão de 18 de julho de 2018, realizou os esclarecimentos para corrigir os rumos daquela interpretação sobre a multiparentalidade em procedimento administrativo.

Passemos à análise do pedido de providências da Corregedoria Cearense e da decisão do CNJ para melhor entender.


Os questionamentos da Corregedoria partiam da premissa de que o Provimento reconhecia a multiparentalidade, de acordo com a interpretação que expus acima, de modo que não haveria como compreender três pontos: (I) Por que utilizar a expressão “unilateral”? (II) Qual a razão de limitar numericamente a composição da filiação a no máximo dois pais e duas mães? (III) Estaria autorizada a adoção da via administrativa por casais homoafetivos com vistas ao reconhecimento da paternidade socioafetiva?


Decidiu o CNJ naquele pedido de providências, em 18 de julho de 2018, que “em que pese o acerto da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado do Ceará em tornar clara a possibilidade de reconhecimento de paternidade socioafetiva por casais de sexo semelhante, o mesmo não se pode dizer quanto à interpretação que conferiu a Corregedoria local quando aponta para permissivo que admite situação de multiparentalidade no registro da paternidade socioafetiva.”


Completou o ministro João Otávio de Noronha, na função de corregedor-geral de Justiça, que “Não é essa alternativa a que se volta o Provimento n.º 63/2017-CNJ. Basta uma mera interpretação autêntica para lançar luz sobre a questão. A adoção do termo “unilateral” se revelou necessária e adequada na medida em que o Provimento buscou promover o reconhecimento voluntário da paternidade ou maternidade socioafetiva de um modo menos burocrático, ante o princípio da igualdade jurídica e de filiação, sem, com isso, abrir mão da reserva à segurança jurídica e sem possibilitar a subversão do procedimento criado, não conferindo espaço para a prática de atos tendentes a propiciar uma “adoção à brasileira”.


Dessa forma, foi esclarecido pelo CNJ que um padrasto ou uma madrasta não podem registrar filho alheio como seu, ainda que pai e mãe biológicos consintam.


Portanto não pode haver outra interpretação: multiparentalidade não cabe em procedimento registral de natureza administrativa.


A única hipótese de multiparentalidade é aquela onde ocorre um processo judicial, e não meramente administrativo em Cartório de Registro Civil, quando um homem apaixonado registra o filho de sua amada como seu, o que se chama adoção à brasileira, ocultando-se do pai biológico o nascimento de seu filho, sendo que posteriormente o filho sabe da verdade e procura obter o registro de sua verdadeira paternidade, ou o próprio pai registral quer descartar o filho por separar-se da mãe daquele filho e anular o registro quando se inicia a busca da verdadeira paternidade, ou ainda se o pai biológico descobre que tem um filho e busca o reconhecimento da paternidade. É o Poder Judiciário, após ampla produção de provas, que deve decidir e segundo o Supremo Tribunal Federal no RE 898.060/SC, de relatoria do ministro Luiz Fux, de repercussão geral, poderá definir o duplo registro: do pai socioafetivo (adotante a brasileira) e do pai biológico.


Foram oficiadas todas as Corregedorias-Gerais da Justiça dos Estados e do Distrito Federal e Territórios, para fins de uniformização e adoção de interpretação do Provimento 63/2017-CNJ, para ciência do entendimento adotado pela Corregedoria Nacional de Justiça quanto ao art. 14 do Provimento 63/2017.


Não pode haver mais dúvida: a monoparentalidade (registro de um filho somente com o nome da mãe) e a biparentalidade (registro de um filho com o nome de dois genitores) são as únicas hipóteses administrativas nos Cartórios de Registro Civil.


*Regina Beatriz Tavares da Silva, presidente da Associação de Direito de Família e das Sucessões (ADFAS). Doutora em Direito pela USP e advogada


Publicação original: O Estado de São Paulo Digital – Blog do Fausto Macedo (18/04/2019)

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